Por meio de múltiplos suportes, Manuela CostaLima vem desenvolvendo uma pesquisa sobre o lugar e seu processo de significação pela experiência humana. Em uma série de trabalhos recentes, a artista realiza derivas por São Paulo em busca de elementos que partilhem sua experiência no espaço urbano. Em outras obras, explora um desdobramento desse ato de deambular e transpõe o seu caminhar para o ambiente virtual. A cidade real, antes percorrida a pé e fotografada, dá lugar à cidade mapeada pelo Google Street View.
Nessas ações, a artista busca investigar o sentido de lugar, além de questionar e trazer novos significados ao ambiente virtual, que à primeira vista se apresenta frio e desprovido de vida e memória.
Os três projetos pensados para esta exposição partem do local da galeria e tratam do caminhar como um instrumento de significação de espaços e de busca por situações que marquem sua experiência.
Logo à entrada da Zipper, a artista impõe a presença do Gabião, um objeto escultórico de grandes proporções. De uma gaiola metálica repleta de pedras britadas, destaca-se uma pedra maior que rompe a trama metálica e escapa da grelha. Vista da janela da sala da exposição, a escultura cria uma ponte entre o que está presente no espaço interno da galeria e seu tema: a cidade.
O Gabião remete a uma experiência no espaço público, e seus elementos constituintes, pedra e metal, relacionam-se diretamente à materialidade das ruas e sua simplicidade brutal. A obra cria uma espécie de barreira para o público e remete a uma tensão entre indivíduo e multidão que se materializa na dinâmica das pedras que pressionam umas às outras e rompem a tela.
O elemento concreto reaparece no espaço expositivo. Na obra Wandering rocks, as vozes da cidade habitam cubos de concreto espalhados pelo espaço expositivo. Em cada um dos cubos estão gravadas as coordenadas geográficas do início e do fim de caminhos realizados em São Paulo em que a artista capta sons e vozes. Os registros desses encontros fortuitos ressaltam pontos do ambiente urbano que adquirem memória, distinguindo-se dos demais. Em conjunto, a instalação forma um grande fluxo de consciência de uma cidade polifônica, um mapeamento sonoro e geográfico, que convida o público a percorrer o espaço urbano a partir desses múltiplos estímulos.
O som que ecoa das caixas e preenche a sala não é um registro exato de cada caminho, mas uma reconstrução a partir de elementos que marcam a memória subjetiva da artista. No ambiente permanece a essência de uma experiência de espaço público.
Esse espaço também é explorado em caminhadas virtuais. A partir da tela do seu computador, a artista captura cenas congeladas da cidade e, ao forçar aproximação por meio do zoom, transforma essas imagens em planos de cor. A repetição da ação traduz seu percurso virtual e o espaço urbano para uma escala cromática que dá origem à obra Geopantone.
Como em uma escala pantone, que contém o código correspondente a cada cor, junto à cada tonalidade captada estão as informações referentes ao endereço virtual daquele lugar, contidas na barra do navegador do Google Street View.A obra propõe assim uma relação com São Paulo a partir de sua paleta de cor.
Em conjunto, os três trabalhos resgatam a essência do espaço público a partir de uma síntese pessoal da experiência vivenciada. O ruído urbano é apagado e o que permanece são instantes singulares captados; as pedras são como edificações em seu estado puro e desagregado; os geopantones representam em cor características do espaço e da paisagem.
Dessa forma, a artista contrapõe instrumentos de controle e racionalização à experiência real e humana. Por meio de uma reconstrução afetiva dos espaços percorridos, busca dar significado àquilo que é frio e desprovido de identidade e apresenta uma cidade singular.
Isabella Lenzi e Juliana Caffé, 2015