"Temos horror ao acaso": ZPR entrevista curador do Algoritmo Cósmico

Entrevista com Icaro Ferraz Vidal Junior, curador do Algoritmo Cósmico
Agosto 12, 2021
"Temos horror ao acaso": ZPR entrevista curador do Algoritmo Cósmico

O novo Online Viewing Room da Zipper "Algoritmo Cósmico" reúne mais de trinta trabalhos de artistas nacionais e internacionais. Com uma pesquisa abrangente e profunda, o curador Icaro Ferraz Vidal Junior nos contou um pouco de suas motivações, descobertas e reflexões acerca da relação humana com o universo e seus padrões. 

 

Leia abaixo a entrevista completa e #descubra o Algoritmo Cósmico.

 


 

 

ZPR - Por que "Algoritmo Cósmico"? 

 

Icaro - Esse nome surge um pouco para dar conta do sentido de ordenação que está implicado no conceito matemático de algoritmo, essa ideia de uma sequência organizada de operações a fim de resolver um determinado problema. Ao mesmo tempo, essa ideia do cósmico dá um pouco a dimensão de uma escala que eu gostaria que o projeto tivesse: os corpos celestes, estrelas, planetas, de alguma forma também se relacionam de uma maneira que a ciência tenta calcular. O nome, portanto, surge de um certo incômodo com o monopólio do debate em torno dos algoritmos que é hoje concentrado exclusivamente nas tecnologias. Será que os fenômenos da natureza, do cosmos, são de alguma forma organizados seguindo padrões algorítmicos? 

 

ZPR - O que você acha que todos os trabalhos que você escolheu têm em comum?

 

Icaro - É um projeto com muitos trabalhos, e cada trabalho se insere dentro da poética de um artista. Todos eles tocam nessa questão da sequencialidade, do padrão, da regularidade dos acontecimentos, de uma natureza modular da percepção. Eles se relacionam com um conceito ampliado de algoritmo, alguns deles se relacionando de forma a chancelar o algoritmo, outros se propondo a questioná-lo. O que conecta esses trabalhos, portanto, não é uma linguagem, já que é um grupo bem heterogêneo, mas sim a maneira com que tensionam relações entre noções como acaso e a necessidade, a determinação e a liberdade e qual a nossa margem de manobra dentro disso. É isso que os reúne: a investigação das formas de compreender essas regras que são subjacentes, tanto ao comportamento da matéria, quanto ao comportamento social, tecnológico, espiritual, cósmico...

 

ZPR - Por que você escolheu fazer um Online Viewing Room?

 

Icaro - Essa forma de difundir a produção artística através da internet é um formato que se popularizou muito a partir do início da pandemia. Era muito importante pra mim que, por estar fazendo o projeto no ambiente digital, eu me permitisse fazer algo que não seria possível fazer no espaço físico. Já que é online, eu tinha a possibilidade de trabalhar com artistas e obras que não estão em São Paulo, ou no Brasil, por exemplo. Isso me permitiu também colocar uma quantidade de vídeos que talvez numa galeria seria mais difícil de funcionar. Eu quis escapar de uma certa nostalgia do espaço físico, é uma outra experiência. Por outro lado, no final do site, a gente tem uma simulação tridimensional em que você pode navegar e ver as obras em um espaço, já que era muito importante que criássemos uma estratégia para mostrar as dimensões e proporções dos trabalhos. Mas eu diria que, resumidamente, o que foi muito importante era que a gente fizesse algo com o digital que não seria possível no físico e também que fosse um espaço que comunicasse uma pesquisa que talvez tenha uma dimensão muito grande para um espaço de uma galeria, de criar uma plataforma que permita ao visitante acessar esse conteúdo no seu próprio ritmo. 

 

ZPR - Para quem nunca viu o projeto, de que maneira você convidaria as pessoas a acessarem o Algoritmo Cósmico?

 

Icaro - A ideia do projeto, e isso se torna muito falado hoje a partir da proliferação das plataformas digitais, é trazer isso, essa noção do algoritmo, de volta pro plano da cultura. Porque as tecnologias digitais, as plataformas, são uma parte importante, mas o esforço de sequenciamento de ações de maneira lógica com a obtenção de se chegar a um determinado resultado é uma coisa que atravessa a história. A ideia não é dizer "somos todos algoritmicamente programados como os computadores são", mas é pensar que os computadores e as plataformas são programadas algoritmicamente como parte de um desdobramento de uma tendência da cultura de compreender os padrões, antecipar eventos e intervir no curso das coisas. Os algoritmos que mediam as nossas vidas nas plataformas digitais são sintomáticos de uma condição cultural muito mais profunda, condição essa marcada pelo horror à indeterminação, o horror ao acaso. Nosso esforço vai no sentido de ser capaz de alguma maneira de calcular, de domesticar, de colonizar essa indeterminação. O convite é pra que a gente dispute o algoritmo. Não só no sentido político, mas também no sentido poético e estético.