
O primeiro Zipper News do ano chegou para recapitular os grandes acontecimentos no circuito de arte pelo mundo que deram-se no mês de janeiro. Nesta edição, nossa seleção de notícias é acompanhada de debates e reflexões sobre arte, política e tecnologia, perpassando assuntos que envolvem manutenção do poder por meio da arte; censura e interesses ideológicos; acesso público às artes; inteligência artificial, criação e direitos autorais.
Recapitule a seguir quatro notícias deste mês.
Conteúdo do artigo:
Expansão bilionária e ingresso exclusivo para Mona Lisa fazem parte do projeto de “renascimento do Louvre” de Macron
Presidente Emmanuel Macron em discurso em frente à Mona Lisa no Museu do Louvre em Paris em 28 de janeiro de 2025. Foto: Bertrand Guay/Pool/AFP via Getty Images
O presidente francês Emmanuel Macron anunciou um projeto ambicioso de renovação e expansão do Museu do Louvre, com um orçamento estimado entre €700 e €800 milhões. A iniciativa, que busca modernizar a infraestrutura do museu e atender ao crescente número de visitantes, está prevista para ser concluída em 2031. Atualmente, o Louvre recebe cerca de 9 milhões de visitantes por ano, mas a reforma visa aumentar esse número para 12 milhões, o que representa um crescimento de 33%.
Entre as principais melhorias previstas estão a construção de uma nova entrada, a revitalização dos espaços subterrâneos de exposições e a criação de uma sala exclusiva para a Mona Lisa. Essa última será acessada com um ingresso específico, além do bilhete tradicional de entrada.
Macron declarou o projeto como um marco cultural comparável à reconstrução de Notre-Dame. Porém, alguns críticos questionam o elevado custo em meio ao déficit público e temem que a famosa pintura de Leonardo da Vinci se torne uma atração descontextualizada, simplificando sua dimensão artística em favor de uma lógica puramente comercial. Laurence des Cars, presidente do Louvre, defendeu a proposta afirmando que o objetivo é melhorar a experiência dos visitantes, reduzindo aglomerações e permitindo um momento mais tranquilo com a obra-prima de Leonardo da Vinci.
Segundo o jornal Le Parisien, apenas uma parcela do financiamento será proveniente do Estado francês. O restante será coberto por recursos do Louvre Abu Dhabi, patrocínios e um aumento no valor dos ingressos para visitantes de fora da União Europeia. Além disso, o Ministério da Cultura da França planeja lançar uma competição internacional este ano para selecionar o arquiteto responsável pela reforma.
DeepSeek, novo concorrente do ChatGPT, é criticado por censurar informações sobre artistas dissidentes chineses, incluindo Ai Weiwei
Foto: J Morc / Mojahid Mottakin / Shutterstock. Edição: Olhar Digital
A inteligência artificial DeepSeek, lançada em janeiro de 2025 como uma alternativa chinesa ao ChatGPT, já enfrenta polêmicas por limitar respostas sobre temas sensíveis, especialmente relacionados a artistas dissidentes. Ao ser questionado sobre figuras como Ai Weiwei, o chatbot se recusa a fornecer qualquer informação, emitindo mensagens evasivas como: “Desculpe, isso está além do meu escopo atual. Vamos falar sobre outra coisa.”
A censura levanta preocupações sobre o controle estatal das tecnologias emergentes na China. Conhecido por suas críticas ao governo chinês e sua defesa dos direitos humanos, Ai Weiwei é um dos artistas contemporâneos mais importantes e influentes do mundo. O fato de DeepSeek ignorar deliberadamente sua existência pode ser um indício da dificuldade de discutir arte dissidente no país.
Especialistas em inteligência artificial e cultura alertam que a autocensura em plataformas tecnológicas pode comprometer o potencial criativo e crítico dessas ferramentas. Apesar disso, a plataforma tem sido elogiada por sua capacidade de processamento, mesmo com recursos computacionais ainda em desenvolvimento. Para analistas, o lançamento de DeepSeek é mais um sinal da corrida tecnológica entre China e Ocidente no campo da inteligência artificial.
Donald Trump retoma plano para jardim de esculturas em homenagem aos “heróis americanos"
Donald Trump e Melania Knauss-Trump na Celebração do Dia da Independência no Monte Rushmore. Foto: Anna Moneymaker para o The New York Times
O presidente dos Estados Unidos, Donald Trump, assinou uma ordem executiva para a criação do “National Garden of American Heroes” (Jardim Nacional dos Heróis Americanos), um parque que contará com 250 estátuas de figuras históricas do país, em comemoração ao 250º aniversário de sua independência em 2026.
A lista de homenageados inclui figuras históricas e políticas como George Washington, Frederick Douglass, Martin Luther King Jr. e Abraham Lincoln, além de celebridades como Kobe Bryant, Julia Child, Whitney Houston e Alex Trebek. Também foram destacados dois ícones conservadores recentemente falecidos, o ex-juiz da Suprema Corte Antonin Scalia e o evangelista Billy Graham, além do ex-presidente Ronald Reagan, porém, a seleção não inclui liberais ou democratas contemporâneos equivalentes.
Já a escolha de artistas visuais como Ansel Adams, Gilbert Stuart, John James Audubon, John Singer Sargent e Norman Rockwell, levantou críticas considerando que suas obras apontam para uma estética específica e ligada a uma visão idealizada e monumental da história estadunidense. A opinião especialista entende que nomes como o de Adams, que imortalizou a natureza em representações grandiosas, e Rockwell, responsável por consolidar a estética do cotidiano consumista e patriótico, podem sugerir uma tentativa de reforçar valores tradicionalistas e uma visão glorificada do passado, além de colocar a arte a serviço de uma identidade conservadora.
A ordem executiva também restabelece medidas anteriores para punir aqueles que vandalizam ou destroem estátuas e monumentos, incluindo a possibilidade de retirar financiamento federal de governos estaduais e locais que não protejam esses marcos. A proposta original do jardim foi apresentada por Trump em 2020, mas não avançou devido à falta de financiamento e à revogação pelo presidente Joe Biden em 2021. Com a nova ordem, Trump busca retomar o projeto e garantir sua conclusão antes das celebrações do semiquincentenário em 2026.
Artistas podem ter direitos autorais de peças que criaram usando ferramentas de inteligência artificial
Escritório de direitos autorais dos Estados Unidos US Copyright Office. Foto: Reprodução
O debate sobre direitos autorais e inteligência artificial volta ao centro da atenção pública desde a publicação de um relatório pelo US Copyright Office, que propõe uma distinção importante: obras criadas a partir do uso de IA podem ser protegidas por direitos autorais nos Estados Unidos, desde que haja uma contribuição significativa de um autor humano no processo criativo. Isso significa que, se a IA for apenas uma ferramenta no processo artístico, a obra resultante pode ter seus direitos autorais reconhecidos. No entanto, o "material gerado puramente por IA", sem envolvimento humano, segue inelegível para tal proteção.
O relatório, que surge após uma série de decisões anteriores do Copyright Review Board, estabelece limites claros, mas ainda flexíveis. A análise será feita caso a caso, dependendo do grau de contribuição humana em relação ao conteúdo gerado pela IA. Por exemplo, uma imagem gerada por IA a partir de um prompt simples pode não atender aos requisitos para proteção, mas se o artista contribui de forma expressiva, como ao organizar ou modificar a imagem, a obra poderá ser considerada para direitos autorais.
Ainda que a publicação propicie novos capítulos para o debate, este ainda está longe de ser resolvido, especialmente sobre questões como o uso de obras protegidas para treinar modelos de IA sem o consentimento dos artistas, e exigem o reexame das leis que regem a indústria criativa.