Dia Nacional do Livro: artistas da Zipper Galeria indicam leituras

essica Costa, Ana Holck, Janaina Mello Landini, Consuelo Veszaro e Gustavo Rezende recomendam obras literárias que inspiram seus processos criativos
Outubro 25, 2024
Interior da Biblioteca Nacional, no Rio de Janeiro. Via rascunho.com
Interior da Biblioteca Nacional, no Rio de Janeiro. Via rascunho.com

 

Em 29 de outubro de 1810, a Real Biblioteca Portuguesa foi transferida para o Brasil, dando origem à Biblioteca Nacional, no Rio de Janeiro. Esse evento marcou um momento importante para a cultura e a educação no país, sendo considerado um dos marcos iniciais da disseminação de livros e da leitura no Brasil e, por isso, a data é celebrada como o Dia Nacional do Livro. 

 

Em ocasião da data comemorativa, convidamos cinco artistas da Zipper Galeria para compartilharem indicações de livros que inspiraram seus processos criativos. 

 

Conteúdo do artigo:

 


“Histórias das mulheres, histórias feministas: antologia” – Jessica Costa


Jessica Costa indica a publicação do MASP, “Histórias das mulheres, histórias feministas: antologia”. Este livro, que Jessica considera essencial, organiza a trajetória das mulheres na arte e reúne textos de artistas, ativistas e críticas que refletem sobre arte e feminismo.


Um dos capítulos que ela destaca é “A criação da feminilidade”, de Rozsika Parker, que também compõe o livro “The subversive stitch” da mesma autora. O texto analisa como as técnicas têxteis foram separadas das artes visuais, refletindo o histórico da marginalização do trabalho feminino. Esse tema é bastante entrelaçado com seus trabalhos, afinal, Jessica é uma artista que amplia as possibilidades expressivas da tapeçaria e do tradicional trabalho têxtil no contexto contemporâneo.

 

Assim como o livro questiona a valorização deste trabalho e a quebra de hierarquias excludentes que se consolidaram na tradição da história da arte, por meio de suas obras a artista também subverte essas estruturas. Os trabalhos de Jessica Costa extrapolam as telas e se expandem para o espaço, como uma provocação acerca do simbolismo da moldura como suporte legitimador da pintura ao longo da história. 

 

“Melhor não Contar” – Ana Holck

 

Ana Holck, que abrirá a individual "Deslocamentos Orbitais" em novembro na Zipper Galeria, indica sua mais recente leitura: o livro “Melhor não Contar”, de Tatiana Salem Levy. A artista identificou uma conexão entre a autoficção da autora e sua própria trajetória. O romance de Levy, que explora temas do universo feminino, infância e a formação da identidade, inspiraram a artista visual a revisitar suas próprias memórias e experiências sob uma nova perspectiva, mais feminista e empoderadora.

 

A estrutura do livro, que incorpora trechos dos diários da mãe da autora, recebidos antes de sua morte precoce, fez Ana Holck rememorar sua própria relação com os cromos que seu pai produziu para registrar o processo de construção das obras de engenharia em que trabalhou. Esses cromos, que Holck só conheceu em 2005, quando seu pai já estava gravemente doente, tornaram-se de grande valor afetivo após seu falecimento, sendo utilizados em sua obra Da Série Canteiro de Obras.

 

Assim como Tatiana Levy transforma os diários da mãe em parte de sua própria voz e criação literária, Ana Holck se apropria e ressignifica os cromos do pai em sua produção artística.

 

“El arte de la ciencia” – Janaina Mello Landini

 

Para sua exposição "Bosque Neural", em cartaz na Zipper Galeria até 1º de novembro de 2024, Janaina Mello Landini teve inspiração nos entrosamentos entre ciência, natureza e arte, impulsionada pelo livro "El Arte de la Ciencia" de Santiago Ramón y Cajal, considerado o "pai da neurociência moderna". A artista, que já era fascinada tanto pela pesquisa científica quanto pelo processo de trabalho do neurocientista, tendo lido anteriormente "The Beautiful Brain: The Drawings of Santiago Ramón y Cajal", encontrou uma nova abertura para explorar essas conexões em sua prática artística.

 

As descrições do sistema nervoso feitas por Cajal, juntamente com os seus desenhos precisos, foram o ponto de partida para explorar a estrutura e função do cérebro. No entanto, para além da questão técnica, o que chama atenção de Landini é a sensibilidade poética do cientista, que ao descobrir essas formações, ficou admirado com a similaridade visual delas com as estruturas arbóreas.

 

A pesquisa do Nobel de Medicina se aproxima dos conceitos estéticos de Landini, especialmente na exposição “Bosque Neural”, que apresenta obras têxteis em formas que evocam tanto as células neuronais quanto as copas de árvores e arbustos.

 

“As cidades invisíveis”, “As Vidas Dos Artistas” e “O guia do mochileiro das galáxias” – Consuelo Veszaro

 

A artista Consuelo Veszaro indica a leitura de um livro que é frequentemente associado à sua produção: "As Cidades Invisíveis" de Italo Calvino. O romance de 1972 é pautado pelo explorador veneziano Marco Polo, que após uma viagem de trinta meses relata suas experiências por diferentes cidades ao imperador mongol Kublai Khan. Nessa narrativa, as cidades citadas se deslocam dos seus sentidos geográficos, tornando-se metáforas de reflexão sobre as muitas formas de perceber e entender o mundo ao nosso redor.

Veszaro, que explora a essência do desenho – ponto, linha e plano – para expressar a potência relacional entre materialidade e espaço, ainda não conhecia o livro quando já havia consolidado sua linguagem artística. No entanto, os paralelos entre suas construções e as cidades imaginárias descritas por Calvino são bastante evidentes pela forma como as linhas e planos sugerem espaços arquitetônicos e mundos inventados.

"Algo que me conecta a este livro é o desejo de construir mundos – no sentido amplo e abstrato. Como artista, o que me interessa é criar espaços e formas", diz Consuelo.


"Retrato do Artista Quando Jovem" – Gustavo Rezende 

 

O livro "Retrato do Artista Quando Jovem", de James Joyce, é uma grande referência do artista Gustavo Rezende. Assim como Joyce articula as influências da Irlanda na formação de seu protagonista, Gustavo explora em sua poética a relação entre lugar, identidade e retrato.

 

Em algumas de suas obras, o artista estabelece diálogos literais com o livro, como por exemplo “Estampa”, uma espécie de autorretrato formado por carimbos com seu nome e endereço, foi inspirado em uma das primeiras passagens do romance, quando o protagonista, ainda jovem, começa a tomar consciência de si mesmo escrevendo seu próprio endereço. "Acho incrível essa passagem sobre como nossa identidade é formada a partir de um lugar. No caso, a Irlanda é construída pela religião, geografia, e outras representações — na verdade, são narrativas em que estamos inseridos e que tracionam nossa existência.", reflete Rezende. 

 

Outro exemplo é a obra que leva o mesmo título do livro, "Retrato do Artista Quando Jovem”, um backlight que apresenta um pequeno autorretrato de referências renascentistas e tem uma relação mais irônica com o livro.